segunda-feira, 30 de novembro de 2015

Acho que é mesmo assim...

Faz amanhã dois meses que eu a deixei lá "sozinha", a tentar não olhar para trás, e faz amanhã dois meses que ela cheia de coragem, por lá ficou com aquele sorriso que é a minha luz e que nunca a deixa. Faz amanhã dois meses que aprendi a ser mais forte e percebi que ela é muito mais valente do que aquilo que pode parecer à primeira vista. Faz amanhã dois meses que a deixei pela primeira vez na Creche.
Posso começar por dizer que não foi um dia fácil! Ao fim de quase cinco meses sem estar longe dela por mais do que uma hora, deixá-la lá, por um dia inteiro, fez-me sentir louca. Temos sempre a sensação de que somos as únicas que sabemos cuidar dos nossos mais que tudo como deve ser e que eles só se entendem bem connosco.

Minha, muito minha.
No meu caso, não podia estar mais enganada! É verdade que tinha apenas quatro meses e meio e que isso, certamente, a ajudou a ter ficado lá na maior. Na verdade nem percebeu bem o que se estava a passar e ainda bem. Com quatro meses e meio querem a barriguinha cheia e muito mimo, venha ele de onde vier (vendidos) e ali, no sítio onde a deixei, eu sabia que muito amor não lhe ia faltar. Se por um lado a alegria imensa com que ela lá ficou, me deixou mais descansada, por outro lado quase me senti traída!!! Então? Eu é que sou a tua mãe (que orgulho), que te carregou na barriga nove meses (a muito custo), que te deu de mamar (e que dores que foram), que te adormece todas as noites (e que simpática que és), que te dá aquele colinho quando choras (e que bom que é) e agora deixas-te ir assim com estas senhoras que não conheces de lado nenhum (traidora)? Confesso que foi um misto de sensações que tive alguma dificuldade em gerir, mas pelo menos fui embora descansada, dentro do que achei possível. Senti que para ela, ser deixada ali, foi como ir a uma festa onde podia curtir à vontade sem a supervisão da mãe! Que bom! Resumindo, acho que me custou bem mais a mim do que a ela.

Por mim, passava os dias assim.
Na passada quarta-feira recebi aquele telefonema que tememos receber e esperamos que nunca aconteça, embora saibamos que mais tarde ou mais cedo, inevitavelmente, vai acontecer. Ligaram-me da Creche a pedir que a fosse buscar assim que pudesse porque ela não estava muito bem, estava a vomitar. Pânico!!! Nunca nos interessa se têm só um macaco no nariz ou se o caso é mais grave, se estão com algum desconforto, ficamos logo desvairadas e viramos o mundo de pernas para o ar até que eles fiquem bem. Eu pelo menos sou assim. Os bebés não deviam sofrer, devia haver uma lei (já que há tantas e tão idiotas) que proibisse os bebés de sofrer (esta lei também seria idiota, mas parece-me muito bem)! Sair da barriga da mãe, é logo uma tarefa bem difícil e a minha que o diga que até de ventosas precisou às quarenta e uma semanas. Estava lá muito feliz no bem bom e sair está quieto. Depois começam logo a levar picas os desgraçados e quando acham que tudo acalmou vêm as cólicas, as abomináveis cólicas. Para completar, os dentes (ainda não chegámos lá, estamos quase).
Já não bastava isto tudo e ainda apanham aquelas viroses terríveis na creche, sítio onde somos obrigadas a deixá-los, estupidamente, ao fim de quatro meses!!! QUATRO MESES???!!! O que é que se passa com este mundo?
Mas voltando ao assunto, lá me chamaram da creche e lá fui eu a correr. Felizmente, quando lá chegámos, eu e o pai que também veio logo a correr (é capaz de ser mais galinha do que eu), lá estava ela com aquele sorriso que não a larga mesmo por nada (que maravilha)!

Babadão.
Por milagre arranjámos uma consulta com uma pediatra que gostámos muito e foi-nos dito que não era nada de mais, só precisava de fazer uma dieta. Que ALÍVIO! A "melhor" parte foi a ordem de ter de ficar em casa com a mãe até passar. Alegria total. Se por um lado me senti triste por saber que a minha cogumela estava com a barriga avariada, por outro lado a alegria de poder estar quatro dias, só eu e ela, cheias de amor e de mimo, deixou-me feliz da vida. E assim se passaram quatro dias de uma cumplicidade cada vez maior, de montes de gargalhadas, de babás e bubus, de traquinices, de amor, de carinho, de mimo, de beijinhos, de abraços, de tudo e tudo e tudo o que é bom nesta vida. Até palmas começou a bater (babada)!!! Hoje chegaram ao fim estas nossas férias de paixão. Se por um lado me sinto feliz por ela já estar pronta para continuar a sua aventura, por outro lado o meu coração está outra vez mais pequenino.
Acho que ser mãe é mesmo assim!

Mostrar o mundo.




quinta-feira, 26 de novembro de 2015

Já experimentaram? Gostam? Zen?!

Há uns tempos atrás comentei que tinha saudades de colorir bonecos como quando era criança. Senti saudades de quando me sentava muito calma e serena com um sem número de lápis coloridos à minha frente e passava umas boas horas a pintar desenhos variados. No final ficava orgulhosa, sentia que tinha acabado de conceber uma obra de arte e depois vinha a avó ou o avô, o pai ou a mãe e diziam: "Está tão bonito! Muito bem!" e eu ficava ainda mais cheia de mim e sentia que tinha feito um bom trabalho. Tão simples que era fazer algo grandioso naquela altura!


Nos últimos tempos, não por sentir falta de ser elogiada por fazer pouco, tive saudades de voltar a colorir. Para além disso, não sou grande fã de televisão, portanto essa não é uma boa solução para relaxar no final do dia. Tocar piano está fora de questão, pois gosto muito do sítio onde vivo e quero evitar ser despejada. Tricotar é algo que gostava muito de fazer, mas ainda não ganhei coragem para aprender essa arte que tanto admiro. Ler nem sempre é opção, pois o cansaço obriga-me a ler a mesma linha umas trinta vezes até que desisto. Por isso, voltar a colorir pareceu-me uma excelente ideia, visto que fazer os meus próprios desenhos ou pinturas se tornaria, rapidamente, um frustração!
Parti então por aí, como uma criança que vai às compras escolher a sua prenda de anos e fui procurar um livro para colorir. Dei de caras com aqueles livros infantis e achei que se tornaria cansativo e enfadonho de tão simples que seria. Procurei mais, até que encontrei este livro!!!


Agora vocês dizem: "Oh Rita vives em que mundo? Só agora é que descobriste isso?" e eu vou ter de vos responder que sim, só agora é que descobri esta maravilha. Talvez a maternidade me tenha deixado pouco tempo para este tipo de descobertas, mas a verdade é que só agora fiquei a saber que isto existe e fiquei feliz!!!
Para começar, o nome agradou-me e os desenhos pareceram-me giros, senti que quando acabasse, iria ter a ilusão de ter feito uma obra de arte, tal como quando era criança.
Cheguei a casa e peguei logo nos meus lápis de cor para pôr mãos à obra e rapidamente me questionei sobre o título. Anti-stress? Zen? Cada vez que o lápis sai fora da linha e pinto o que não devo, sinto-me louca! Vocês não ficam furiosos quando o lápis sai para fora do contorno e estraga tudo? Apetece-me fazer como quando era pequena, arrancar a folha e começar de novo, mas como já cresci um bocadinho, tento contornar a situação. Talvez o livro não seja por si só anti-stress, mas sim um caminho para conseguir controlar o stress.


Independentemente de ficar fora do sério quando não pinto tudo certinho e bonitinho, a verdade é que estou a gostar de me sentir pequenina outra vez. Agora o livro de colorir anda comigo para todo o lado e que jeito que dá quando temos de fazer tempo nas salas de espera dos consultórios, quando vamos à segurança social ou às finanças e até para ir passear ao final do dia num jardim e colorir um bocadinho.
Por mim está aprovado. E vocês já experimentaram? Gostaram?


segunda-feira, 23 de novembro de 2015

Acontece-vos o mesmo?

Desde que fui mãe há uma certa tendência para os meus amigos acharem que deixei de ter vida. Parece que na cabeça de algumas pessoas, esta minha nova condição de ser mãe, impede-me de querer sair, jantar fora com uns amigos, dançar, beber uns copos, ir simplesmente passear numa tarde de domingo. "Não te convidei, porque agora como és mãe..." Agora como sou mãe o quê?! Tenho a dizer que sim, sou mãe e agora que sou mãe estou mais viva do que nunca. Digo até, que estou com mais vontade de viver do que antes. Agora que sou mãe, sinto-me mais alegre, mais completa, mais cheia, mais feliz, com mais vontade e com mais vida.

Alegria de estar e de viver.
Esqueçam-se dessa ideia (que foram buscar não sei onde), de que nós mães vivemos num mundo que não vai muito mais para além de fraldas, leite, berros e papa pelo ar. Nós fazemos muito mais do que isso e precisamente por sermos mães, percebemos que os dias podem ter 48 horas ou mais, se quisermos. Ser mãe, exige-nos uma capacidade de gerir o tempo que nunca achámos ser possível. Cumprir com todas as tarefas que já faziam parte do nosso dia a dia e acrescentar a isso, todos os malabarismos que um bebé nos obriga a fazer, é obra, mas é possível. Não só é possível, como o medo de não ter tempo para tudo resulta em ficarmos com tempo de sobra para fazermos o que nos apetece. Algumas mães, com filhos mais ariscos, hão-de estar a achar-me uma palerma que vem para aqui romancear a loucura que é ter um ser de 60 cm em casa, já para não falar das que têm mais do que um filho, ou dois ou três!!! Bem sei que é uma loucura, mas na verdade tenho sorte, a minha filha é uma simpática e são poucas as vezes que tenho vontade de me trancar no armário aos berros (disse poucas, não inexistentes) e por isso tenho tempo para muita coisa, inclusivamente para estar com os meus amigos, assim eles não queiram pensar que me transformei num alien.

Passear é bom e faz bem.
Se ser mãe condicionou a minha vida, como me perguntam tantas vezes? Sim, claro que sim, mas se não quisesse esta condição, não teria sido mãe. São mais as vezes em que o programa de sexta-feira à noite é ficar em casa à espera de ser requisitada para preparar um biberão de leite, do que as vezes em que saio por aí com destino incerto. No entanto, a segunda hipótese, felizmente, ainda faz parte dos meus planos e espero que faça por muito tempo. No que diz respeito aos passeios de domingo à tarde, tenho a informar que os bebés podem sair de casa, podem e devem apanhar ar e até podem ir a esplanadas. Só não convém oferecer-lhes café ou uma sagres, mas de resto até gostam do convívio (pelo menos a minha gosta).

Gelado também não convém.
Ser mãe é uma aventura que todos tentam, atenciosamente, entender, mas que nem todos conseguem. Ser mãe é muito mais intenso do que alguns imaginam, mas ao mesmo tempo, muito menos impeditivo do que a maioria pensa. Ser mãe não é deixar de ter vida, mas sim ganhar muito mais amor à vida. Ser mãe não é deixar de ter tempo, mas sim aprender a multiplicar o tempo.
Ser mãe é ser mãe e ser mais ainda do que sempre fomos.



sexta-feira, 20 de novembro de 2015

Clave de Ti. Conhecem?

Sabem o que é musicoterapia? Conhecem as suas vantagens? Já pensaram fazer este tipo de terapia?
Se têm alguma dúvida nas respostas a estas perguntas fiquem por aí que não se vão arrepender.
Fui falar com a Marta Carvalho que me esclareceu todas as dúvidas sobre as maravilhas da musicoterapia e deu-me a conhecer o seu novo projecto Clave de Ti, que tem em parceria com a sua amiga e colega Joana Bolito e a quem se juntou a Margarida Arcanjo. São as três musicoterapeutas que nos prometem fazer acreditar nas diversas vantagens da terapia através da música.

Marta Carvalho e Joana Bolito
Em conversa com a Marta, explicou-me que a paixão pela música já vem de há muito tempo, devido ao impacto que esta provoca em si. O seu interesse pela musicoterapia surgiu aquando da leitura do livro Musicofilia de Oliver Sacks e desde então que fala da música e das suas potencialidades com o entusiasmo que pude testemunhar durante a nossa conversa. Afirma que a música tem a capacidade de influenciar as nossas vidas, tanto para o bem como para o mal e que nos pode ajudar ao nível da nossa expressão emocional. "Cada um sente a música à sua maneira. Acredito muito no potencial da música e por isso interessei-me pela musicoterapia".
Na tentativa de explicar de uma forma simples o que é a musicoterapia, esclarece que é uma intervenção terapêutica, centrada na pessoa, e que pretende ajudá-la, tratá-la ou pode ainda, funcionar apenas para desenvolvimento pessoal. "Na psicoterapia o mediador é a verbalização e na musicoterapia, é a música. A vantagem desta terapia é que não nos obriga a falar, podemos expressar-nos a tocar ou a ouvir música. Não existe preocupação estética, não tem de soar bem, a música tem de soar ao que faz sentido. Tem de ser espontâneo". Os objectivos não são então musicais, mas sim terapêuticos e são específicos para cada pessoa e para cada caso. Confirma que não é necessário saber música ou saber tocar um instrumento para fazer sessões de musicoterapia. No entanto, embora possa parecer que se trata apenas de um momento lúdico, esta terapia tem muito mais que se lhe diga. "Estão-me sempre a perguntar: que música me darias para ouvir?" (risos). "Não, não é assim tão simples, não é assim que funciona. Cada pessoa tem a sua identidade musical, cada pessoa sente a música à sua maneira e a primeira coisa que um musicoterapeuta tem de fazer é descobrir essa identidade e trabalhar com esse material que é muito pessoal".
A Marta trabalha neste momento com crianças que têm dificuldades emocionais e de comportamento e acredita que a música, por ser tão flexível, pode ajudá-las a controlarem melhor as suas emoções. "Quando fazemos música exercitamos a cabeça, estamos focados no que estamos a fazer e isso ajuda-nos a encontrar um equilíbrio. A ideia nunca é dificultar. Não há objectivos musicais e por isso não vai sendo cada vez mais difícil como acontece no ensino". Sublinha que a relação entre o musicoterapeuta e o paciente é extremamente importante, pois é através dessa relação e das experiências musicais que vão partilhar, que este irá explorar as suas vivências e aperceber-se dos seus problemas. "Com a música, facilmente nos sentimos confortáveis e como é muito flexível, tanto podemos fazer algo mais estruturado, como podemos fazer algo mais livre".
As sessões podem começar com improviso, de forma a ir ao encontro do paciente, sendo que por vezes os resultados são surpreendentes e o mesmo sente-se capaz de desabafar ao som da música que está a produzir. Começa então, a aceitar os seus problemas, naquele ambiente relaxado onde encontra liberdade para expressar as suas emoções. "Eventualmente até encontra forma de lidar com os seus conflitos".


As sessões podem ser individuais ou em grupo, dependendo dos casos, e pode ser feita com qualquer pessoa, nem que seja apenas para desenvolvimento pessoal. A Marta é da opinião que todos devíamos fazer psicoterapia e lembra que a musicoterapia é uma excelente opção. Pode também, ser uma alternativa para pessoas com doenças neurológicas, deficiências motoras, crianças com défice de atenção, idosos e grávidas. "Os idosos gostam muito de recordar memórias antigas e por isso tentamos reviver experiências do passado, mas sem tristeza. Já com as grávidas o foco é a relação entre a mãe e o bebé de forma a reforçar esse vínculo". A musicoterapia aplicada a grávidas pode também ajudar em situações de depressão pós-parto.
Concluímos então, que a musicoterapia é um mundo que interessa explorar e conhecer, sendo que pode ter repercussões positivas para qualquer um de nós.

Apaixonada pela música, pela musicoterapia e pelo trabalho que tem vindo a desenvolver, decidiu então aceitar o desafio proposto pela sua colega Joana Bolito e fazer acontecer a Clave de Ti. "Quando acabámos o curso estávamos decididas a arranjar emprego e a Joana teve esta ideia para divulgarmos o nosso trabalho e eu aceitei". Confessa que não tem sido fácil, pois admite que ainda existe algum preconceito relativamente à musicoterapia e por isso esclarece que "apesar de ser uma terapia feita de forma lúdica, existe muita seriedade em todo o processo e os resultados são visíveis". No entanto, acredita que devagar, as pessoas vão começando a perceber as vantagens da musicoterapia.


O nome está relacionado com as claves utilizadas na notação musical (clave de sol, fá e dó), cada uma com a sua função e com a sua característica, tal como cada um de nós. "Cada pessoa tem a sua clave, com as suas características e musicalidade por explorar". O objectivo da Clave de Ti é, também, divulgar e sensibilizar as pessoas para este tipo de terapia complementar que por não ser verbal, está ao alcance de vários tipos de população.
No final da nossa conversa sublinha, mais uma vez, que todos nós deveríamos fazer psicoterapia ou musicoterapia e lamenta o preconceito que ainda existe nesta área.

Ponham então os preconceitos de lado (se os tiverem) e descubram a Clave de Ti (cliquem para conhecer). A Marta Carvalho, a Joana Bolito e a Margarida Arcanjo estão à vossa espera e prometem ter a solução que podem estar cansados de procurar e não encontrar. Elas estão também no facebook (é só dar o clic)
Eu fiquei convencida.

quinta-feira, 19 de novembro de 2015

Até já!

Passaram-se dois dias em que não escrevi. Não escrevi por não ter o que dizer e agora escrevo para dizer que não sei o que escrever. Nem sempre podemos estar cheios, nem sempre podemos estar carregados de sentimentos e de emoções para partilhar. Por vezes, é preciso darmos descanso ao nosso pensamento para que ele possa crescer outra vez. Eu precisei destes dois dias e talvez até precise de mais alguns, ou talvez não. Não há problema em precisar de tempo, muito pelo contrário. Há sim problema quando achamos que podemos contrariar o tempo, quando achamos que podemos viver sem nos darmos tempo para que o tempo nos permita ter tempo de sermos outra vez. Eu às vezes preciso desse tempo.

Autoria da imagem: Carla Francesca Castagno

Por vezes sabe bem andar mais leve, mais vazio. Há momentos em que me sinto menos cheia do que é costume. Sou intensa nos meus pensamentos e emoções e por vezes, preciso de respirar. Preciso, apenas, de respirar fundo para depois poder regressar a mim, para poder regressar há imensidão de sensações que deixo viver dentro de mim. Só sei viver intensamente, no que é alegre e no que é triste. Só sei viver por inteiro. Não gosto de estar apenas de passagem. Mas às vezes é preciso deixar-me passar, para mais tarde me poder entregar. Nem sempre é fácil encontrar esse equilíbrio e por isso estou-me a dar tempo.
Até já.


segunda-feira, 16 de novembro de 2015

Vocês não têm saudades? Eu tenho e vou voltar!

Penso que há sempre uma fase da nossa vida em que estudar é sinónimo de pesadelo. Quando andamos na escola ou na faculdade, sonhamos com o dia em que os estudos vão acabar de uma vez por todas e vamos começar a trabalhar. Normalmente, os mais velhos dizem-nos para aproveitarmos bem essa fase da nossa vida, porque aqueles tempos é que são bons e nós, normalmente, encolhemos os ombros, reviramos os olhos e achamos que os mais velhos estão a delirar, até porque essa fase da nossa vida costuma coincidir com aquela em que achamos que somos donos e senhores da razão e de toda a sabedoria do universo. Nós é que sabemos o que é "fixe" e o que é "fixe" é começar a trabalhar e não ter de aturar os chatos dos professores. "Quando trabalhar faço o que eu quiser!"


Coitadinhos, tão inocentes que somos nessa altura e tão longe da verdade que nós estamos. Então estudar é que é uma seca? Trabalhar é que é bom? Quando trabalhares fazes o que quiseres? De facto quando me lembro de ter alguns destes pensamentos, dá-me vontade de atirar para o chão e rebolar de tanto rir. É verdade que trabalhar é bom quando trabalhamos naquilo que gostamos e eu felizmente, não me posso queixar. No entanto, se o nosso emprego está longe de ser aquilo que sonhamos, haja coragem. Quanto ao fazer o que quero no meu emprego, isso já é outra conversa. São mais as vezes em que me vejo obrigada a fazer o que me mandam, do que faço exactamente o que quero. Quanto à parte de deixar de aturar os professores... Pois bem, pelo menos os professores vão variando e não aturamos sempre o mesmo, já o patrão, esse não muda e quando é chato, o melhor é mesmo respirar fundo.


Talvez por ser professora, tenha tomado, rapidamente, consciência da quantidade de vezes que fui uma palerma para os meus professores. Mas faz parte, não é verdade? Sabe sempre bem acharmos que somos os maiores! No entanto, não deixei de ser uma valente parvinha. A verdade é que foram tantos os professores que não gostei como aqueles que gostei e até tive a sorte de ter alguns que adorei!


Nunca, mas nunca me vou esquecer da minha professora de piano. Era a professora Isabel e tanto que eu gostava dela e gosto. Lembro-me de ir para as aulas de piano feliz, mas mesmo mesmo feliz. Para mim, ela era bem mais do que uma professora, eu via-a como uma amiga e como alguém que estava sempre ali para me ajudar. Acho que ela nem imagina, nem nunca imaginou, o quanto eu gostava das aulas dela e o que significavam para mim.  Se não me engano, foi minha professora durante três anos e meio e num desses anos eu passei por uma fase mais complicada da minha vida e mal ela sabia que a única coisa que me deixava feliz naquela altura, era ir ter com ela para ter aula de piano. O pior, é que eu fui tão parva que deixei de aparecer na aulas de um momento para o outro e sabem porquê? Porque comecei a trabalhar e o trabalho ocupava-me demasiado tempo. Fui sempre prometendo a mim mesma que lhe ia ligar a explicar o porquê de ter fugido assim, mas o tempo foi passando e a vergonha de lhe aparecer à frente foi aumentando, e de que maneira. O resultado foi ter deixado o último ano de piano por concluir e nunca mais ter dito nada à professora Isabel, coisa de que muito me arrependo.



Mas vamos lá deixar-nos de dramatismos, porque nunca é tarde para reparar os estragos da tempestade de estupidez que deixámos para trás. Vou voltar a estudar. Pois é, vou voltar a estudar, está decidido e não podia estar mais feliz. A vergonha de ligar à professora Isabel não passou, mas apareceu-me um anjo caído do céu, a Teresa. A Teresa sempre tocou muito bem piano e foi minha colega na escola onde estudei música. Sempre tive pena de não sermos mais próximas. Ela era daquelas pessoas que tinha sempre um sorriso para dar e uma palavra alegre e de incentivo a dizer, em todas as situações. Gosto de pessoas assim! Quando pensei em voltar a estudar piano, lembrei-me logo dela, perguntei-lhe se ela me queria aturar e ela disse que sim, para minha grande surpresa e felicidade. Já tivemos a primeira aula e correu muito bem (pelo menos para mim, já ela não sei se ficou com uma valente dor de cabeça de me ouvir tocar, mas como é simpática, sorriu como sempre). Não me podia estar a sentir melhor por voltar a estudar piano e melhor ainda por estar a fazê-lo com a ajuda de alguém que me deixou logo tão entusiasmada. Foi bom ouvir as palavras da Teresa e sentir que é possível dar conta deste desafio a que me propus.
No final do ano, quando completar o oitavo grau de piano, prometo que me vou encher de coragem e dizer à professora Isabel. Também quero dizer à professora Margarida, que foi a minha primeira professora de piano, era eu tão pequenina e de quem eu também tanto gostei e gosto.
Vou viver de tanto aprender!


domingo, 15 de novembro de 2015

Serão só palavras?

Numa altura em que se tenta exprimir tantos e tão confusos sentimentos e emoções por palavras. Numa altura em que se podem ler e ouvir tantas dessas palavras de amor e ódio, de compaixão e de desprezo, de conhecimento e de ignorância, acredito que acima de tudo nos devemos respeitar e tentar compreender. Cada um com o seu motivo, com o seu medo e com a sua opinião, liberta as suas palavras, muitas vezes até, sem pensar. No entanto, é sempre importante ter consciência das nossas palavras


Há palavras que se soltam da nossa boca como foguetes e sentimentos que inundam o nosso coração como explosões! Há lágrimas que provocam na nossa alma verdadeiras tempestades e sorrisos que despertam na nossa mente a certeza de um amanhã melhor, muito melhor!


Palavras...o que são palavras?! O que carregam dentro de si e o que transmitem, afinal, de verdadeiro? Palavras soltas, palavras pensadas, palavras sentidas, palavras sofridas, palavras alegres, tristes, assim assim... mas SEMPRE, APENAS PALAVRAS!



Palavras magoam, palavras ferem, palavras alegram, palavras confortam, palavras dizem verdades, palavras dizem mentiras, mas mesmo sendo apenas palavras, as palavras MARCAM!!!
Palavras são como aquela nódoa que deixamos cair na roupa, por vezes sem querer, outras propositadamente, porque é uma roupa velha que já nos fartámos de ter, porque nos habituámos de tal maneira a ela que perdeu o valor que tinha da primeira vez que a encontrámos na loja. Mas a nódoa fica e a roupa dificilmente voltará a ser a mesma e é aí que nos decidimos se a preferimos deitar fora para um lugar onde nunca mais a possamos ver, ou se ainda assim, mesmo com a nódoa que a marcou, a queremos guardar connosco porque afinal, já não nos lembrávamos do quanto estimávamos essa simples peça de roupa. Mas ainda, se a nódoa for deitada sem querer, podemos ter a sorte desta sair facilmente e poucas ou nenhumas marcas deixar! No entanto, mesmo que a nossa intenção fosse a melhor, ela guardará sempre consigo uma marca, por muito pequena que esta seja...



São palavras, são as simples palavras que tantas e tantas vezes não medimos, tantas e tantas vezes nos arrependemos de dizer e tantas outras sonhamos tanto ouvir! São palavras que nos enchem, preenchem e esvaziam! São palavras que nos definem e que formam a nossa imagem.
Estou cansada de palavras!!! Quero ver, quero sentir, quero amar, quero provar, quero-me deliciar... Quero SENTIR!!! As palavras esgotaram-se e quando as palavras se esgotam, restam-nos os sentimentos, as emoções, o amor e esses não se mostram, nem se dão a conhecer por palavras.

Não quero mais palavras.





sábado, 14 de novembro de 2015

De luto.

Estou aqui sentada, no sossego da minha vida e no conforto da minha casa, com a minha filha deitada ao meu lado. Ela brinca com uma fralda de pano e de vez em quando olha para mim e sorri. Indiferente a tudo o que se passa, desconhece a maldade que há no mundo, felizmente. Ela, aqui deitada no seu sossego, na sua paz, na sua alegria de viver, na sua pureza de alma, no seu coração cheio de amor e na sua cabeça vazia de maldade, faz-me pensar. Ela não se importa com o tom de pele de quem por ela passa. Ela desconhece o significado do véu islâmico e do crucifixo cristão. Ela vê pessoas, vê simplesmente pessoas, independentemente das suas crenças religiosas e da sua cor. Ela sabe muito mais do que muitos. Ela vê com muito mais clareza do que muitos.


Como será possível, alguns de nós, um dia, ficarmos tão longe daquilo que já fomos? Talvez seja infantil esta minha maneira de pensar, mas não consigo entender, por mais que tente, como há quem perca toda a inocência que um dia já teve. Não consigo entender, como há quem deite fora toda a bondade que connosco nasce. Como há quem apague todo o amor que já sentiu?
Hoje, dificilmente poderemos viver de tanto rir. Hoje, até mesmo quem quer, terá dificuldade em rir. Hoje o dia é triste, hoje o dia é de pouca luz. No entanto, hoje o dia é de ainda mais amor, para todos aqueles que não se esqueceram do que já foram.

Autoria da imagem: Jean Jullien

quinta-feira, 12 de novembro de 2015

Fotografias contadas

Ao passar, perguntou-me porque razão estava eu ali, de manhã, tão cedo, a tirar fotografias. "Isto não tem interesse nenhum menina. Está tudo velho. E como anda o governo, assim vai ficar por muito tempo".


Sorri, como quem compreende o seu tom de desagrado e a sua confusão e disse-lhe: "Eu sei que está velho, mas estou a tirar fotografias porque gosto, porque me apetece". Não me ligou, não quis saber, perdida nos seus problemas e inquietações. "O parque infantil está na mesma. Vêm as crianças aproveitar o sol e não podem brincar".


Certa da sua razão e solidária com a sua preocupação, disse-lhe: "É uma pena. Mas sempre podem ver o jardim que a senhora arranja com tanto cuidado". Desejei-lhe um bom dia e segui o meu caminho. Ela sorriu envergonhada e desejou-me, também, um bom dia e ali ficou presa ao chão pelos seus sapatos gastos, com a sensação de ter os braços amarrados.


Foram tantos os dias que ali passou, que deixou de ver a beleza que ali existe, mesmo à sua frente. Esqueceu-se, nos dias perdidos que ali passa, que todas aquelas flores bonitas lhe passam pelas mãos e que ficam mais coloridas depois dela, por elas passar.
Esqueceu-se, mas eu hoje lembrei-a e ela sorriu.



Arrependimento

Cada passo nesta escada já foi uma certeza. Foi a certeza de que caminhava no sentido com sentido e de que nunca iria querer voltar atrás.


Agora, cada degrau que piso, esconde uma lágrima que ficou por cair e um sufoco que me consegue desesperar.


Ali, sentado, esperei. Esperei que a vida chegasse, enquanto ela esperava por mim. Vi-a passar, tantas e tantas vezes, cheia de vida e de vidas que se perderam, ali. Também a minha lá ia, direita a lado nenhum. Se o arrependimento pudesse castigar, eu viveria de castigo para sempre. Agora digo; não subas essas escadas por onde todos passam, constrói as tuas. Não esperes por essa vida onde todos se perdem, encontra a tua.




Com encanto

Era naquele recanto que nos encontrávamos. Era naquele recanto que nos beijávamos e era naquele recanto que com encanto ela me dizia: amo-te.


Dizia um amor tão imenso como o verde daquele jardim e eu dizia o meu, tão denso como as pedras daquele chão.
Agora sento-me sozinho neste recanto, onde com o seu encanto, ela me disse num pranto que o jardim já não era verde. E tudo chega ao fim. As pedras estão tão densas como antes e para mim, o verde está mais vivo que nunca.


Fico à espera então, que as pedras passem a ser areia e que o verde passe a ser, quem sabe, o azul do mar.
Agora já sei que aquele recanto nem sempre poderá ter o encanto que ela um dia lhe deu.


quarta-feira, 11 de novembro de 2015

Também têm o mesmo dilema?

Decidi mudar de visual! Há alturas em que tenho esta necessidade de me renovar, reinventar, refrescar... sei lá! Preciso de uma mudança e pronto. Há quem goste de usar sempre o mesmo penteado, o mesmo corte, a mesma cor de cabelo e se lhes falam em cortar um dedo de comprimento até lhes dá um arrepio na espinha. Já a mim, o arrepio só me passa pela espinha se pensar em estar sempre na mesma. Quando me decido a esta mudança, seja ela maior ou menor, há sempre quem aprove e quem desaprove. Ou melhor, há sempre quem goste mais e quem goste menos, e até quem não goste mesmo nada. Isso nunca me interessou! Eu gosto, ou até posso não gostar tanto assim, mas faz-me bem.


No entanto, desta vez a decisão foi mais difícil de tomar. Desde que sou mãe, faz esta semana 6 meses (sim, estou a dizer isto com um sorriso parvo e toda orgulhosa de mim), que me custa mais "sair da casca". Parece que de alguma forma, agora já não posso ter um ar menos sério. Sou mãe bolas! Tenho de ter ar de mãe! Mas afinal o que é ter ar de mãe? Calma, também não acho que temos de andar de saia travada abaixo do joelho, camisa apertada até cima e carrapito. Mas de certa forma, acho que a mini saia, os decotes, as botas de cunha e o cabelo de outra cor, pode ser demais.

Esta até está atrevidota com a saia pelo joelho.

Eu já me deparo desde a gravidez com o problema de olharem para mim e dizerem: "Coitadinha, tão novinha e já com um barrigão daqueles". Eu tenho 27 anos, mas pelos vistos, aos olhos da maior parte das pessoas, sou uma criança. Não sou assim tão nova, também não sou velha, mas é verdade que há mais quem me dê 18 anos do que quem me dê a idade certa. Embora ache que isto de ser mãe me deu um ar mais adulto (ou não)!

Eu, grávida de 36 semanas

Mas voltando ao assunto, para além de me confrontar com estes comentários, queria evitar que dissessem também: "Olha aquela com aquele ar de tarada e já é mãe!!"
Quem me estiver a ler, há-de achar que tenho um ar super alternativo, mas não, Na verdade, até me acho tímida de mais para poder não ser uma pessoa discreta e talvez por isso, quando decido ser um bocadinho mais arrojada, já acho que estou a exagerar.


Quero acreditar que esta minha nova condição maravilhosa de ser mãe, não me impede de vestir e transformar como quero. Sou o que sou, não sou a minha roupa ou o meu penteado. Não importa se tenho cabelo castanho ou vermelho, se uso saltos ou sapatos rasos, se uso mini saia ou saia travada abaixo do joelho, de todas as maneiras sou a melhor mãe do mundo, ou pelo menos tento ser.


E vocês também sentem o mesmo? Também se preocupam mais com o vosso visual desde que são mães? Têm medo de parecer umas malucas com os vossos filhos ao colo? Ou acham só que este meu dilema é completamente estúpido e palerma? Por um lado, até gostava que me dissessem que esta minha preocupação é ridícula, mas por outro lado, se souber que há por aí quem se reveja nesta história, sinto-me menos maníaca!!!
Vá lá, contem-me tudo!



terça-feira, 10 de novembro de 2015

Fiquei feliz por saber!

Fez ontem uma semana que comecei a escrever para vocês e fez ontem uma semana que me propus a não desistir desta vez. E sabem que mais? Ainda bem que achei por bem deixar-me de vergonhas e decidi mostrar, a quem quiser ver, aquilo que tenho para dar. Surpreendentemente, há muito mais pessoas atentas e curiosas em relação ao que temos para dizer, do que eu imaginava e isso deixou-me feliz.


Fiquei feliz por saber que gostam de ler as minhas palavras e fiquei feliz por perceber que nos interessamos uns pelos outros. É bom saber que há quem não viva fechado no seu grande pequeno mundo, sem olhar à sua volta. Alegra-me a partilha que percebi existir. A partilha de coisas boas ou menos boas, porque afinal, o importante é partilhar.



Obrigada pelo incentivo que me têm dado. É bastante encorajador e confesso que me sabe muito bem. As vossas palavras deixam-me ir dormir mais quentinha e de coração mais cheio. As vossas palavras fazem-me acreditar e acreditar é bom. Nunca é de mais acreditar.
Não há dúvida que nos devemos renovar constantemente e nunca desistir de fazer melhor. Eu quero fazer mais e melhor para vocês, porque merecem. Continuo a acreditar que somos sempre capazes de ser mais e para isso, basta querer.  Acreditarmos nas nossas loucuras, sem hesitações, é o melhor que podemos fazer, por nós e pelos outros.


Façam o que vos apetecer, o que vos passar pela cabeça. Arrisquem e nunca desistam. Não tenham receio daquilo que os outros possam pensar e não tenham dúvidas de que podem ser grandes, enormes até. Procurem-se mais, porque certamente vão gostar daquilo que vão encontrar. Acreditarmos em nós, é a maior alegria que podemos dar a nós próprios.
Vamos viver de tanto acreditar!


segunda-feira, 9 de novembro de 2015

"Caídas em Desgraça"

Fui falar com os actores Ana Campaniço e Carlos Alves, que têm em comum, não só a profissão, mas também a boa disposição e simpatia. Numa conversa agradável quis saber um pouco mais sobre a peça que, brevemente, vão levar a cena no Auditório Carlos Paredes, em Benfica, de 12 a 21 de Novembro.

Ana Campaniço
Carlos Alves
A peça de que falámos chama-se "Caídas em Desgraça" e a autoria é do Carlos. Já a encenação ficou a cargo dos dois actores. Também "caídas em desgraça" estão as actrizes Florbela Tibúrcio e Inês Moita que participam na peça, ao lado dos dois actores com quem tive o prazer de conversar.

Florbela Tibúrcio, Inês Moita, Carlos Aves e Ana Campaniço.
Curiosa, comecei por perguntar como surgiu a ideia da peça e disse-me o autor que quando pensou num tema, surgiu-lhe a crise financeira actual e assim, decidiu brincar com a crise. No entanto, deixou claro que não quer, de forma alguma, banalizar a situação pela qual passamos. "Pensei falar nos ricos e não nos pobres", disse-me ele, e assim criou uma família rica de banqueiros, responsável pela crise, mas que acaba também por ser vítima dela. Através desta família escreveu uma comédia que se insere no panorama actual e daí o nome "Caídas em Desgraça". Nesta família sobram apenas as mulheres e o mordomo, símbolo de uma família que em tempos foi rica. "Elas perderam tudo e o mordomo terá um papel fundamental no desenrolar de toda a história. Mas quanto a isso, já terão de ir ver a peça para ficarem a perceber". Deixa-nos assim curiosos (pelo menos a mim deixou), para irmos ver esta peça em que a crise é o contexto, mas onde poderemos ver muito mais do que isso.


Quanto à escrita da peça, revelou que normalmente há sempre alguma história ligada ao seu momento, mas que desta vez tal não aconteceu. Demorou cerca de um mês a ser escrita, pois é o prazo que normalmente estipula para ele próprio, para que desta forma consiga concluir a peça. "Se não estabelecesse um prazo, nunca acabava. Para mim, nunca estaria bom!".
Ao falarmos um pouco sobre os ensaios, asseguram os dois que momentos engraçados não faltam. "Há sempre partes em que não nos sentimos seguros, então decidi que se houvesse alguma coisa que ainda não estivesse bem, voltávamos atrás. A dada altura já fazia de propósito para me enganar e termos de repetir". Diz-nos a Ana, com um sorriso na cara que nos confirma ter sido capaz de deixar os seu colegas fora do sério. "Acabamos por ter de ser mais exigentes com os actores porque estamos na presença do autor da peça", reforça a actriz e encenadora.

Durante um ensaio da peça "Caídas em Desgraça".
Perguntei-lhes se tinham algum ritual antes de entrar em palco. "Fica muito mal dizer que tenho de fumar um cigarro?", pergunta-me a Ana. Confessa então, ter de fumar para aliviar o stress. Já o Carlos, também fumador, diz que fumar faz mal e por isso uma hora ou duas antes das peças deixa de fumar. Confirma que o poderemos ver dançar durante a peça (estão com vontade de ver não estão?) e que se apercebeu que ao fumar perdia facilmente o fôlego.
Para além de fumar, a actriz falou-nos de um momento especial que não deixa passar em branco antes de pisar o palco. "Peço sempre ao meu velhote que olhe por mim, porque ele pode estar lá para cima distraído". Refere-se ao pai que faleceu em Março do ano passado. "Tenho sempre uma conversa com ele antes de entrar e sei que ele vai orientar a malta". Diz também, que olha sempre para cima e entra com o pé direito. Para além destes pequenos rituais, confessa ficar com mau feitio no dia anterior à peça. "Às vezes fico insuportável e o Carlos tem de levar comigo". A mim, pareceu-me que o olhar do Carlos quis confirmar esta afirmação, mas não quero criar conflitos!
Já o Carlos diz que precisa de concentração antes de entrar em cena para poder passar o texto todo pela cabeça. Revela-nos também que se tem de benzer antes de pisar o palco. "É mais ou menos como os futebolistas (risos). Já é quase uma necessidade que tenho porque faço isso desde a primeira vez".

Algures por aí, quem sabe, em busca de concentração.
Já com superstições a conversa é outra. "Merda" é palavra de ordem e "sorte" é palavra proibida. O actor confessa que também não passa por baixo de escadas e que tem sempre muito cuidado com espelhos, não lhe vão bater à porta sete anos de azar. "Não ligo muito a essas coisas, mas com espelhos é diferente. Quando tenho de andar com um espelho, tenho mesmo muito cuidado. Para mim, um espelho não se pode partir".
Começaram por dizer que não tinham qualquer tipo de ritual, mas depois da nossa conversa fiquei com algumas dúvidas.
Como muitos já sabem, a Ana e o Carlos são mais do que colegas e por isso quis saber se em casa, as conversas vão para além dos assuntos de trabalho. Embora tenham começado por dizer que o trabalho fica em cima do palco, o Carlos acaba por dizer "Eu acho que a maior parte das conversas são sobre trabalho e quando não são sobre o nosso trabalho, são sobre o trabalho dos outros que fazem o mesmo que nós." Contudo a Ana acrescenta "Mas dá-nos gozo". Acabam por concluir que de facto falam sobre trabalho, "mas não nos absorve por completo", diz o Carlos e concordam os dois.

Não parecem estar para grandes conversas.
No dia anterior à peça a conversa já é outra e confirmam que existe sempre alguma tensão em casa. "Sou espaçosa de mais e quando preciso do meu espaço, preciso a dobrar, mas o Carlos não me leva a mal." Quando lhe perguntei se o Carlos também ficava com mau feito, ela disse-me que não. "Mas sei que no fundo ele está nervoso. Antes de entrar em palco lembra-se sempre de coisas que não deve.". Em sua defesa o Carlos diz que quando não é o encenador não se preocupa tanto. Por falar nisso, acaba por admitir que não gosta de acumular o trabalho de actor e de encenador. "É muita responsabilidade e exige um maior esforço, no entanto não deixa de ser um desafio". A verdade, é que se têm visto obrigados a desempenhar diversas funções nas peças que levam a cena, pois o estado da cultura está longe do que gostariam que fosse e por isso decidem escrever, encenar e representar, pois ficar em casa de braços cruzados não é, para eles, uma opção. "Acredito que haja peças melhores que as nossas e ainda bem que sim, mas quem faz melhor também começou como nós e as nossas também são boas", diz-nos a Ana. De uma coisa têm os dois a certeza, é que querem trabalhar naquilo que gostam e que melhor sabem fazer. "Quando não temos trabalho, arranjamos nós.", dizem os dois quase em uníssono. Embora admitam que ultimamente também já o fazem por gosto e não tanto por falta de oportunidades. Pois, sabem que quando as coisas dependem só deles, os prazos são cumpridos e corre tudo como planeado. Esta persistência dos dois actores tem-se feito notar e começam a não passar despercebidos.

Assim, é normal que não passem despercebidos.
"E quando alguma coisa corre mal em palco", perguntei-lhes eu. "Há chapadões e ele é que vai dormir para o sofá", diz a Ana a rir-se. Confessam que nunca houve grandes problemas, pois têm muita confiança um no outro, aliás, como deixaram transparecer ao longo da nossa conversa. "Quando acontecem erros ficam ali, não afecta nada o ambiente em casa", diz Carlos. Admitem que o nível de exigência dos dois é elevado e se não corre bem, facilmente ficam irritados. Resumindo, as coisas até podem correr pior, mas uma coisa é certa, não acaba o namoro, nem em casa, nem no trabalho, e ainda bem, pois queremos ver os dois juntos tanto num sítio como no outro, por muito tempo.
Para terminar não podia deixar de lhes fazer a pergunta óbvia: "Sentem-se caídos em desgraça?"
"Passo recibos verdes todos os meses. Estás a brincar comigo?", responde a Ana. "Eu sinto-me um bocado caído em desgraça", diz o Carlos. O actor questionou-se sobre o que poderia significar para as pessoas o título da peça e acha que, certamente lhes dirá alguma coisa. "Independentemente da história, acho que o título irá chamar a atenção, porque há muita gente que se sente caída em desgraça e não quer dizer que esteja na miséria."
No entanto, como actor, diz não se sentir caído em desgraça, porque nunca teve uma vida estável. "Os actores nunca estão caídos em desgraça, ou então, estão sempre!", diz Carlos. "Nós gostamos de contar os trocos. O amor à arte é tão grande que não tenho medo do que tenho pela frente.", diz a Ana.

Determinados, como sempre.

O autor da peça sublinha que apesar de ser uma comédia, quer que as pessoas vão para casa pensar depois de a ver e que sintam alguma coisa.
Concluem que, no fundo estão caídos em desgraça, mas não é assim que se sentem. Pois, quem não desiste de lutar, dificilmente cai em desgraça.
Quando estávamos a terminar a conversa, o actor, encenador e autor Carlos Alves fez-me uma exigência. Pediu-me que vos transmitisse a sua opinião em relação à cultura em Portugal, que diz com toda a certeza, que essa sim, está caída em desgraça. Acrescenta ainda que não é apenas por causa do dinheiro, mas também pela forma como é encarada, não só pelos políticos, mas pela maior parte das pessoas. "Os políticos desistiram da cultura e as pessoas parecem estar a ir atrás. Se os políticos desistirem das padarias, as pessoas vão continuar a comer pão. Por isso, os políticos podem desistir da cultura, mas se as pessoas quiserem, ela vai continuar a existir."
Admite nunca ter tido qualquer apoio do estado e ainda assim, nunca desistiu e apela a que as pessoas façam o mesmo.
Apoiem então a cultura e o teatro e vão ao Auditório Carlos Paredes entre os dias 12 e 21 de Novembro para ver a peça "Caídas em Desgraça". Vão-se deixar cair em desgraça? Eu sei o que vou fazer!